isto anda tudo ligado (1)

os meus afazeres profissionais são constituídos por algumas preciosas deslocações, vá para fora cá dentro (em serviço), e levaram-me mais uma vez a nelas: reunião de manhã, seguida de… almoço… e como dizem por aí, é à volta da mesa que as coisas se tornam interessantes… assim o é ainda mais quando se está perante uma boa gastronomia regada por bom vinho, da região, como é claro…
à volta da mesa, representantes e técnicos locais, técnicos de vários sectores de actividade da administração e nós… muitas coisas em cima da mesa, muitos assuntos aflorados, e uma questão que tomou muito do tempo de conversa, e que tem muito que ver com as dinâmicas da contemporaneidade, com a cidadania, e o confronto local / global!
vivemos num tempo em que decisões num ponto do globo podem afectar sobremaneira o contexto de outros pontos bastantes díspares desse, em que pequenas revoluções tecnológicas ou inovações científicas também podem assumir tais consequências, e que vão acontecendo hoje em dia de uma forma estonteante e que nem se dá por elas.
há por vezes alterações significativas nas dinâmicas de desenvolvimento de determinadas áreas / regiões, entendidas por demasiado complexas, ou analisadas em contexto estrito, e acontece que pelos dias que correm as origens dessas modificações são bastante simples de identificar, e encontram-se a milhares de quilómetros de distância. sem querer ser exaustivo, até porque nesta escrita ligeira não há espaço para essa análise, deixo aqui apenas um exemplo dos novos tempos, e do reposicionamento do indivíduo…
recorrendo às leis de mendel, os japoneses do tohoku research station, em morioka foram desenvolvendo a partir de 1939 uma nova variedade de maça, denominada fuji, tendo começado a sua produção em 1958, e mais recentemente recorrendo às novas possibilidades permitidas pela biotecnologia, conseguiram atingir um produto que é caracterizado desta forma: ‘aromáticas, doces, sumarentas, estaladiças e de textura firme, com a aparência a variar entre o amarelo-verde intermitente com vermelho até quase totalmente vermelha’ [ver descrição no site washington state apple comission ou no fruit from washington), inundando vários mercados com este seu produto resistente e de aparência irresistível, a preços imbatíveis…
como em muitos outros sectores, coloca-se a questão do preço da produção, em que países como a china, que também começaram a produzir esta nova variedade de maça, conseguem preços baixíssimos que chegando até nós, por vezes permitem um preço de venda ao público inferior ao preço no produtor. quem diz, maças, diz sapatos, camisas, etc.
para abreviar, há uma luta de opção entre produção nacional / produção exterior, preço barato, menos barato ou caro. não consumir produtos nacionais é inferiorizar o tecido produtivo nacional e condicionar a criação de riqueza, fornecendo a outros os rendimentos que poderiam permanecer em território português e contribuir para o desenvolvimento do país (as discussões em torno da globalização, da organização mundial do comércio, do proteccionismo e/ou da sua abolição aos produtos nas fronteiras, está tudo em debate). e também em debate os custos ambientais, referindo-me por exemplo aos custos da denominada pegada ecológica.
acontece que com estas transformações, o indivíduo deixou de ser apenas um cidadão, e transformou-se num cidadão-consumidor. as escolhas não são mais apenas efectuadas periodicamente através do voto nas urnas, mas dão-se a cada instante, a cada nova aquisição. o acto de optar por um ou outro produto é o novo voto e o novo meio de expressão de vontades (políticas, sociais, económicas, culturais).
parece é que esta nova forma de expressão de vontades, este ‘novo voto’ é de alguma forma muito diferenciada e potenciadora de desigualdades, porquanto indivíduos de maiores rendimentos têm possibilidade de opção, indivíduos mais desfavorecidos não têm essa possibilidade, sendo o único critério de escolha o do preço mais baixo, ou seja, não têm possibilidade de escolha, não têm voto.
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