idos no nosso tempo
nos últimos dias pereceram algumas figuras do portugal do ‘nosso tempo’: vasco gonçalves (03/05/1921-11/06/2005), no sábado, com 84 anos, e ontem, 13 de junho, álvaro cunhal (10/11/1913-13/06/2005), a caminho dos 92 anos, e eugénio de andrade (19/01/1923-13/06/2005), com 82 anos.
destes três personagens da história, muito ênfase se tem colocado nos dois primeiros, políticos, e figuras marcantes num dado momento da história recente portuguesa. Ao terceiro, referências mínimas.
é, no entanto, o desaparecimento de cunhal que tomou conta da actualidade jornalística e noticiosa. não que não tenha sido de facto uma figura que pela sua acção e abnegação, espírito de luta, sempre defendeu e abraçou a causa dos ideias que mantinha.
tem-se que salvaguardar as devidas distâncias e ter a exacta noção das proporções: cunhal foi de facto marcante, influenciando e servindo como referencial para a acção e a luta de muitos portugueses, hoje cada vez menos, mas é verdade que hoje se celebra a sua ‘morte física’, porquanto já era tido como alguém afastado, não só fisicamente, mas também no campo das ideias, onde cada vez mais a realidade se distanciava daquilo que eram as suas ideias para o país e o mundo.
agora, não se pode pactuar com esta indigência, bem característica do nosso canto lusitano, que é a da morte como apaziguadora das consciências, ou dito de forma mais corrente: depois de morto, é que passa a ser um homem fantástico e adorado por todos, inclusive pelos seus mais ferozes adversários, que aparecem em ditos bajulados sem sentido.
concordo plenamente com josé francisco viegas, quando escreve no aviz que ‘o melhor que se pode dizer de um homem de quem se discordava é que continuamos a discordar dele, mesmo depois da morte’.
ora aí está um verdadeiro assomo da noção da exacta proporção das circunstâncias e da relatividade.
também não se pode deixar de referir que a morte de eugénio de andrade, salvo raras excepções, tem passado ao lado desta míriade de fóruns, debates, prós e contras, e outras parafernálias que tais…
por um lado, há que reconhecer que a figura de eugénio de andrade não se presta a essas pretensiosas acções de ‘homenagem’ e ‘valorização’.
por outro lado, é o reconhecimento de alguma forma tácito, de que este é o encerrar quase definitivo de um tempo do portugal (que só encerrará verdadeiramente com mário soares)
é ainda o reconhecer que em portugal, os homens (e as mulheres) das letras não são reconhecidos nem valorizados, ainda mais gravoso quando cantam e são expressão do portugal.
por fim, é o reconhecimento de que cunhal tem (teve) um fim, e de que eugénio não terá fim nunca, porquanto os ‘poetas e a poesia são de sempre’, e atravessam todos os tempos
essa é a verdadeira homenagem que se pode fazer a eugénio de andrade, e que o tempo se encarregará de devolver o homem e o poeta e a sua poesia ao lugar que merece, e ao lado dos maiores criadores
1 Comments:
A comunicação social e a sociedade em geral têm muito a aprender com a homenagem que aqui prestas a Eugénio de Andrade.
Uma homenagem simples para um homem que apreciava a simplicidade e a discrição.
Eugénio de Andrade é intemporal, viveu, vive e viverá nesta geração e através das gerações que se seguirão.
Esta é a verdadeira homenagem aos Homens das artes e letras, tantas vezes esquecidos e maltratados em vida, são eles os que atingem a verdadeira imortalidade que tantos ambicionam e nunca alcançam...
14 agosto, 2005 21:35
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